A juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho, substituta da
Justiça Federal de Ponte Nova (Minas), absolveu a Vale, a Samarco e
a BHP das acusações de crimes ambientais na tragédia de Mariana – a
qual deixou 19 mortos e lançou 13 mil piscinas olímpicas de lama
tóxica no Rio Doce em 2015. A magistrada livrou as empresas de
imputações de destruição de bem protegido, poluição qualificada,
omissão, obstrução de fiscalização e falsidadade de documento.
Ao Estadão/Broadcast, o advogado Alberto Zacharias Toron, que
representa a BHP, afirmou que a decisão é “longa, minuciosa e mais
do que acertada”. O advogado indicou ainda que a sentença “não
elide a eventual responsabilidade civil das empresas, que está
sendo objeto de um grande acordo”.
A sentença de 191 páginas assinada na madrugada desta quinta,
14, após oito anos de tramitação do processo na Justiça de Minas,
sustenta que não há prova suficiente para condenação, que as
empresas não teriam concorrido para as infrações e ainda cita
“atipicidade da conduta” – quando determinada conduta não é
prevista como crime.
“Após uma longa instrução, os documentos, laudos e testemunhas
ouvidas para a elucidação dos fatos não responderam quais as
condutas individuais contribuíram de forma direta e determinante
para o rompimento da barragem de Fundão. E, no âmbito do processo
penal, a dúvida – que ressoa a partir da prova analisada no corpo
desta sentença – só pode ser resolvida em favor dos réus”, anotou a
magistrada.
A decisão foi proferida em meio a uma sequência de eventos
ligados à tragédia de Mariana: a homologação, pelo STF, do acordo
de R$ 170 bilhões para reparação dos danos da tragédia; e o início
de julgamento, em Londres, sobre possível indenização aos atingidos
pelo tsunami de dejetos, no bojo de um processo ambiental coletivo
que é considerado maiores do mundo.
A absolvição também atingiu: Ricardo Aragão, ex-presidente da
Samarco (2012-2015); Kleber Luiz de Mendonça Terra, ex-diretor de
Operações (2012-2015); Wagner Milagres Alves, Gerente Geral de
Operação de Mina (2014-2015); Germano Silva Lopes, Geral de
Projetos Estruturantes (2014-2015); e Daviély Rodrigues Silva,
gerente de geotecnia (2008-2015).
A juíza juntou uma espécie de preâmbulo à sentença, anotando que
tomou “a única decisão possível diante da prova produzida, convicta
de que o exercício do poder punitivo em um Estado Democrático de
Direito é subsidiário, fragmentário e não pode ser convertido em um
instrumento de escape para a ineficácia das demais formas de
controle social”.
Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho cita o acordo de R$ 170
bilhões para reparação da tragédia e diz esperar que todos os
atingidos pela catástrofe “justa e efetivamente reparados,
consciente de que mesmo a mais vultuosa das indenizações já pagas
será incapaz de compensar o que lhes foi tomado”.
Segundo a magistrada, nem uma “sentença penal condenatória
proferida em uma miríade de incertezas poderia honrar a memória
daqueles que perderam a vida” no desastre.
Falta de provas sobre relação entre omissão e
desastre
Ao analisar a responsabilidade penal da Samarco ante ao
rompimento da barragem de Fundão, a magistrada entendeu que, apesar
do reconhecimento de omissões de funcionários e da empresa do caso,
a falta de prova sobre a relação de causa e feito entre tais
omissões e a tragédia levou à absolvição de pessoas e, por
consequência, da empresa.
O Ministério Público Federal ainda atribuia à empresa a adoção
de política de redução de custos com a segurança de barragens e mau
gerenciamento da governança de barragens.
Na avaliação de Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho, as
análises realizadas no curso do processo, pela Procuradoria e pela
Polícia Federal, nãom era conclusivas e indicavam “apenas a
sugestão de que a política de redução de custos, adotada pela nos
anos que antecederam o rompimento da barragem de Fundão, pode ter
impactado no fator segurança”
“A prova dos autos não indica um problema grave na gestão
executiva da Samarco que explique o rompimento da barragem de
Fundão”, anotou a magistrada.
Deficiência na comunicação
De outro lado, Patrícia reconheceu que não havia uma
“comunicação devidamente orquestrada” na Samarco. Segundo ela, a
deficiência na comunicação ficou evidenciada “em uma situação que
pode ter importado para o rompimento da barragem, mas o nexo causal
não foi provado no curso da ação”.
A situação em questão a um relatório de 2014 com “impressões
técnicas relevantíssimas” que não foi compartilhado com a empresa
contratada para elaborar o laudo de estabilidade da barragem de
Fundão.
“Não se pode afirmar o que teria acontecido se o dito relatório
tivesse maior publicidade. […] Talvez a realização completa do
estudo, seguido da construção de uma berma mais robusta, como
sugerido pelo consultor, não tivesse impedido ou mesmo retardado o
rompimento abrupto da barragem de Fundão. Ou talvez tivesse, e
então a barragem não teria se rompido”, anotou a juíza.
“Impossível determinar sem uma prova técnica (ou quesito)
dirigido a este esclarecimento. E como já fundamentado, não há nos
autos qualquer prova que aclare esse nexo causal”, seguiu.
Patrícia chega a ponderar que este último ponto poderia levar a
uma “hipotética” condenação da Samarco se a legislação brasileira
“tivesse evoluído a ponto de admitir a responsabilização criminal
da pessoa jurídica fundada em sua autorresponsabilidade”. A juíza
ainda citou aplicar ao caso, em tal sentido, um precedente do
Supremo Tribunal Federal, mas entendeu que seria necessário que o
MPF provasse os “aspectos pertinentes aos critérios de imputação da
pessoa jurídica, o que definitivamente não foi feito”.
Com a palavra, O advogado Alberto Zacharias Toron, que
representa a BHP
“A sentença da juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho é
longa, minuciosa e mais do que acertada. Uma primeira observação
que se deve fazer neste caso é que, a despeito de toda dor causada
pelas mortes, a despeito de todo mal ambiental causado pelo
acidente, a juíza apreciando os fatos, a partir dos relatos que
constam no processo e de todas as perícias realizadas, chega a
conclusão de que não houve imprudência, imperícia e menos ainda
qualquer dolo, mesmo na vontade, mesmo na modalidade eventual, que
tivesse dado causa a esse triste acidente – ao contrário.
As perícias demonstram que a obra representada pela barragem
estava de acordo com a arte desse tipo de edificação. Em outras
palavras: a obra se apresentava edificada de forma correta. E ela
vai além. Não houve nenhum incremento em termos de atividade de
risco que tivesse dado causa ao rompimento da barragem. Aliás, é
expressivo o fato de que a principal testemunha acusação, o
professor Pimenta Ávila, foi expresso na audiência, na frente do
Ministério Público, dos juízes, de todos os advogados quando disse
que nem Deus poderia prever o rompimento da barragem. Ou seja, no
estado em que ela se encontrava era imprevisível o acontecimento.
Então, isso não pode ser debitado de maneira nenhuma à Samarco, a
BHP, à Vale (BOV:VALE3) e aos engenheiros que trabalhavam na
obra.
Portanto é uma sentença que merece aplauso. É bom ressalvar que
isso não elide a eventual responsabilidade civil das empresas, que
obviamente como foi amplamente noticiado está sendo objeto de um
grande acordo. Acho que se fez justiça e essa decisão merece
aplausos efusivos, porque a Justiça dá a exata dimensão do que é
ser juiz penal especialmente num caso como esse que causou tanta
dor e tanto clamor também”.
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